Sementes

Minha querida filha,

Algumas lições não se aprendem na escola, e tu já sabes disso. Ainda assim se faz-se o ensino dessas mesmas coisas, seja por alguma boa alma que se disponha a ensinar ou pela vida que dá essas lições sem o nosso consentimento.

Uma coisa que aprendi recentemente é a arte do plantio. Escolhi uma terra boa, um suporte bom e um lugar com sol e sombra para as sementes que iria depositar. Plantei memórias, histórias, saudades, amigos, discos e livros. Plantei também alguma esperança, um tico de habilidades para ganhar dinheiro e reservei um bom espaço para o amor.

A semente do amor é curiosa. Ela surge de tantas maneiras que não se consegue prever quando dará frutos. E ela cresce fácil fácil, não precisa nem de muitos cuidados, ela vem e floresce. Minto. De cuidados precisa sim. Qualquer pé de ressentimento, muda de desconfiança, ramo de ciúmes ou broto de desprezo pode ir lá e detonar o pezinho de amor que está nascendo. Pior, pode vergá-lo até virar enredo de novela ruim ou tema de musica sertaneja-brega.

Porém, o pé de amor é valente e é capaz de passar por tudo isso com maestria, se lhe for dado alimento, atenção e uns beijinhos periódicos (dizem que barras de chocolate ou vultuosas contas na Suíça têm efeitos similares. A conferir!) que ele volta ao viço de antes. Só a uma doença ele não resiste: a rejeição.

Amor é fruto de querência de junto, não de separado. O ato de amar, por si mesmo, é dizer que o objeto do amor faz parte de ti, de tua vida. É o que tu fazes quando baixas fotos dos seus ídolos, baixas os discos das tuas bandas, choras nos filmes dos teus astros. Sabes que a vida deles lhes te é importante e amas a eles como fosse um irmão, um amigo, um namorado. Mas se eles te negam suas próprias vidas, tu matas a empatia. O amor falece como flor no copo no meio da sala. Eles rejeitam o amor que tu tens por eles e rejeição é o extremo oposto do que o amor é.

O pé de amor morre.

Estrelas

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As estrelas brilham na minha terra. Na terra em que sou eu, elas deixaram de beijar o céu. É a cidade quem ilumina a noite como se fosse simulacro do sol.

Na minha terra, na terra em que nasci, as estrelas estão lá. Por enquanto.

Não tenho medo (acho) do fim das coisas. Claro que há a agonia que precede o risco, mas aceito racionalmente que tudo tem o seu fim.

Quando a luz da terra que me acolhe tira as estrelas de mim, aceito sem traumas que estamos fadados à noite clara, à noite sem deuses imperiais sobre nossas cabeças, ao fim do deslumbre ante o pseudo-eterno, o ilusoriamente imutável.

Mas sinto que o vazio que consome meus sonhos clama por um breu impossível, um fim para a loucura do dia, a paz derradeira de espírito.