O rapaz dizia que não ia se envolver novamente, dizia que não havia mais espaço nem tempo na sua vida para outra pessoa. Não queria dividir o que havia conquistado com tanto esforço e que havia uma grande “oferta” de sexo e companhia para pessoas como ele no “mercado”.
Ele não estava errado. Não era feio, nem baixo, não era um boçal ou um ignorante. Nem o contrário disso. Sabia que o extremo era complicado e que, na maioria das vezes, o medíocre é que tem o sucesso no longo prazo. É o que menos se desvia da curva-padrão. Sabia disso porque era o seu ganha-pão. Analisar riscos e processos, êxitos e valores. Decidiu que isso se aplicaria para o dia-a-dia na grande bolsa de valores que é a aventura amorosa.
De pronto, não se envolveria. Não dá certo. Já vira muitos falirem porque achavam que Aquela Empresa ou Esta Companhia eram portadoras da salvação patrimonial de sua família. Normalmente quem sobrevivia era quem apostava nos “relacionamentos horizontais”. Da mesma forma, quem criava uma “Linha Vertical de Investimentos” naufragava se Outra Indústria aparecesse no mercado derrubando a “da vez”. Eram necessárias atenção e uma certa descrição para fazer investimentos por fora. Aliás, muita atenção.
Então se agarrou à essa análise e aplicou-a, transformando da thesis para a praxis e em um mês colhia os resultados.
Estava certo de que daria mais trabalho inicialmente. Afinal tinha de montar o “portifólio” de opções de investimentos, analisar o esforço e o quanto deixaria aplicado em cada ação, preparar os “planos B” de ação, montar o cronograma de atendimento, acompanhar o desenvolvimento de cada um dos itens do “repertório”. Ufa!
Isto feito, era só cuidar de repor uma ação quando apresentasse algum problema e deixar sempre claro que nunca faria um investimento exclusivo para nenhuma delas. Umas reclamavam que assim nunca garantiriam o “aporte” que estavam contando para si, outras afirmavam que também procederiam da mesma maneira.
Regras do jogo, à mesa, ele jogava como poucos. Perdia às vezes. Empatava na maioria. O empate, aqui, sempre é o melhor resultado.
Uma regra ele nunca quebrara: aplicar em ações “próximas”. Achava que a proximidade afetava o seu senso de avaliação e o seu desempenho no trabalho. Pior, era algo mais íntimo e sub-reptício que um casamento. Estar com a mesma pessoa todos os dias depois do expediente e durante os fins de semana já era algo que ele não queria pra si mas podia entender, já que era o comportamento dominante da espécie. Agora, além disso, ter essa pessoa o tempo inteiro ao seu lado no trabalho era algo que extrapolava os limites.
Por isso a surpresa dos três amigos quando, no bar, ele confessou o fato.
“Estou apaixonado.” “Não fode, cara!” “Sério Gordo, tô de quatro pela menina” “…”
A menina em questão era a que trabalhava ao seu lado. Recém-chegada ao escritório, ela era bem “neutra”, não era linda, nem era escultural, não era Einstein de saias nem era o repositório da cultura da humanidade. Nem o oposto disso. Era acima da média, mas não a ponto de se destacar na multidão a priori.
Porém, quando abria a boca ou contava um caso ou ria das próprias besteiras ou falava com as mãos, denunciando uma timidez (ou loucura) controlada ou quando falava de shows de rock ou de casos que ouvira dos famosos ou quando olhava atentamente no fundo do olho ou quando não escondia que brigava no trânsito ou quando soltava um palavrão que não cabia no seu molde ou quando falava quatro idiomas ou quando sorria… ah… quando ela sorria…
“Pelo menos cantou?” “Não Burro! Porra! Tá maluco? Vai que ela topa? Vai que ela não topa? Analise, cara! Analise! É uma no-win situation. Não tem como ter vitória.” “E aí? Como você vai fazer?” “Não vou, Grande, não vou.”
Os amigos não tinham muito a acrescentar. Burro decepcionou-se profundamente e todos beberam até raiar a madrugada.