historieta

o menino conhece a menina e se encantam.

viram noite e dia e mal põem as roupas e riem das coisas bobas e se chocam com as coisas sérias e quebram camas e comem feijoadas. eles bebem cachaça e vinho e comem peixe cru e vivem cinco meses de amor putaria paixão carinho piada e mais carinho. daí é tempo pra vida e a vida dá tempo para que eles passem sozinhos e vejam rostos corpos beijos conversas mas nada era como antes e nada fora do jeito que fora. pelo menos ele achava assim. ele quisera que as fotos que tiraram juntos fosse a história pra sempre felizes para sempre. mas a moça pensa diferente. eles em choro e papo e carinho dizem adeus e a historia termina aí.

mas tem outro parágrafo cinco anos depois quando eles se vêem de novo e ele balança como sempre balançou ao ver as fotos, ouvir as músicas que ele não gostava mas ela amava e ele passou a gostar de chico e ela de roquenrou maluco e eles se flertavam mas a vida vadia ficou entre eles e eles não se amavam mais porque amor é coisa que se conjuga dois. amor sozinho é maluquice, é punheta, é coisa de gente velha que deixou as pessoas morrerem antes dele e ficou para contar história de todos que nem lembra mais. ele olha a moça bonita e nem é moço mais.

ela diz que ama ama e ama e o amor dela é tão grande que o coração vai embora e passeia no mundo no xingu no meio do mato com os índios e deixa rodar pelo mundo. enquanto roda ela se diverte com os meninos tolos mas o coração volta e volta com saudade e vontade e ela deixa os meninos irem embora moídos e quebrados e quando o coração volta traz tristeza e vontades que não ficam juntas que não ficam no mesmo teto.

o velho ouve a moça e quer ser moço de novo para amar. mas amar é para os moços e para as meninas de saia esvoaçante. para quem sabe que a vida é uma história a ser contada e não recalque, frustração e desejo macerado.

o velho só tem a si e a história acaba.

Das ausências

Catarina caiu e quebrou o braço e engessou-o e ficou boa e teve o primeiro flerte na escola e o primeiro admirador e foi no primeiro show de roquenrou e teve os seus períodos e já não é mais a menina bonitinha, mas a moça que se engraça a cada dia mais.

Ela escolhe cadarços, posta no tuíter, fica de castigo, tira notas ruins, aprende a tocar violão e baixo e teclado, brinca com o irmão como uma “superior” e derrete-se em lágrimas e sonhos e hormônios adolescentes irracionais que irão lapidar da personalidade impertinente e irritante da moleca que nos abandona uma belíssima mulher.

Me pede livros, que os dela já “acabaram”. Pede os da moda, os legais, os que jamais lerá (os que eu escolhi), pede para ir ao cinema, para comprar uma revista, um gibi, um brinquedo e um doce. Pede um beijo e uma promessa de presente de fim de ano legal e que eu já tenho de bolar na cabeça. Talvez uma guitarra, talvez um cascudo se não passar de ano, talvez um Nintendo DS.

Conhece bandas que eu nunca ouvi ou ouvirei, conhece atores que nunca curti, programas de tevê que eu não tomo ciência, divide tudo comigo e eu simplesmente – e atavicamente – ignoro. Teimo ainda que tenho mais a ensinar que aprender e ainda não chegou o momento em que me convenço que estou enganado.

Enganado. Nunca errado.

Ficou comigo um fim de semana porque a bisa tava doente, a avó ficou com a bisa e mãe tinha viajado. Teve cafuné, papo, macarrão colorido, doce, filme, beliscão, implicância e a sensação que estou perdendo um tempo precioso com coisas que não me dão o alento devido como trabalho, noites, farras e jogos de computador.

Dessa maneira torta, toco a vida sabendo que a pessoa – o protótipo de gente – que é o ser vivo mais importante na minha história, cria-a sem a minha presença, sem a minha influência diária, sem a minha sombra a fazer-se temer, honrar ou amar.

E cria-se bem.

histórias de sexo casual

…as minhas variam entre o patético e o sublime (que descambam pro melancólico), mas tem uma que é contável.

Eu trabalhava na Bloch editores e saí para uma festinha com o pessoal do trabalho. era aniversário do editor da finada e saudosa revista Incrível e fomos todos encher os cornos de tequila. À época, sexo para mim era um evento quase teórico, exercitado diariamente em experiências solo, aquela coisa que adolescente faz incessantemente até quebrar alguns recordes e um nerd tru faz até achar o tom de voz com o sexo desejado.

À mesa das libações estavam os amigos nerds-varões da redação e quatro meninas. Era a turma toda da redação e mais uns agregados da Geográfica Universal que foram cooptados pela simpatia do Sérgio, editor-chefe. Depois de uma garrafa e meia de tequila e diversas doses de álcool variado, propus a uma delas — a mais gatinha, a mais lindinha, a mais improvável — um estica no bar Empório, em Ipanema. ela, para minha total surpresa e estarrecimento, topou.

Depois, no botequim, rolou um papo aqui, uma bebida ali, acabamos no Vip’s, no caminho de São Conrado. Disso só sei por conta das lembranças do motel que vieram no meu bolso porque desde o momento em que sentamos no boteco até o meio do dia seguinte só tenho lembranças pontuais de beijo, toque e carinho e da cara de desespero da menina ao acordar, olhar os corpos nus e dizer: “Zander? VOCÊ?”

Daí foi só constrangimento e carona para casa.

Aniversários

Esse blogue fará oito anos na primeira semana de janeiro e cada vez menos vejo motivos para mantê-lo. Não tenho audiência, prestígio ou “conversão focada” como diria um amigo de um blogue mais pragmático. Não melhorei meu texto, não virou fonte de projetos nem de dinheiro. Não me deu amigos, amores ou paixões (esses fi-los apesar do blogue, exceções contadas).

E o principal, deu-me poucas felicidades. Mantenho-o como uma coceira, uma mania, um vício, um desespero. Arremeto-me a ele quando a mente acalma ou as emoções transbordam. Só recorro a esse espaço quando se faz necessária uma terapia, uma cachaça ou uma masturbação compulsiva. É coisa de doente, de louco.

Ainda assim, ele tem uma sobrevida

Metas cumpridas

Há alguns anos eu fiz uma lista de coisas que queria fazer antes dos quarenta anos. Boa parte – a maioria – delas eu consegui fazer. Falta apenas juntar algum dinheiro de fato, mas acho que já estou no caminho, meio caminho andado.

Hoje, no entorno dos quarenta, tento me projetar à frente e tento desenhar que tipo de pessoa quero ser aos cinqüenta. Quero crer que chegarei fácil em 2020 mais lúcido, rabugento, pernóstico, prolixo e promíscuo que chego hoje, mas essa estrada tem mais armadilhas que a minha vista consegue alcançar.

Mal sobrevivi os meus dez primeiros anos. Ficava doente sempre aos verões, corri risco de perder a vida umas três vezes ao menos. Descobri-me perdendo os céus e o jogo de pipas com a miopia cavalgaste, descobri-me irremediavelmente apaixonado pelos olhos verdes e azuis e inexoravelmente sabendo-me abandonado pelas mulheres.

Os dez anos seguintes foram menos arriscados para a minha saúde, mas determinantes para a formação do meu (mau-)caráter. A adolescência me transformou de criança linda e andrógina em um protótipo de membro da banda Devo. Ao mesmo tempo me ensinou a duras penas que ser diferente não é bom, nem ruim, é apenas o jeito que tenho. O meu destino, a minha caligrafia no caminhar. Optei pelo que é alternativo, estranho e bizarro não por fetiche, mas por sobrevivência. Os deuses que me perdoem, mas não entendo o culto pela a adolescência, pela juventude eterna.

Durante os meus vinte anos vi meus sonhos morrerem, meus ideais soçobrarem, uma carreira degringolar e minha esperança no ser humano puro e eternamente evolutivo desmontar. Tornei-me arrogante, amargo, cruel, grosso, ambicioso, frustrado, torpe, tedioso, mediocrizaste. Ao mesmo tempo minha filha – minha luz, minha obra, minha vida – nasce e minhas prioridades viram de ponta-cabeça. Começo a pensar seriamente em sobreviver os meus trinta anos e ver minha filha tornar-se uma mulher.

Nesses tais de trinta anos, essa tal de quarta década para os que sabem contar, vivi o mundo que pude abarcar com braços, pernas, mãos, bocas, ouvidos, nariz e outras extremidades. Beijei bocas impensáveis, comi comidas inacreditáveis, escrevi textos deploráveis, ouvi músicas que só sonhara na adolescência – não tinha internet para fazer downoad de discos raros, meninos e meninas – e consegui aparar arestas cujas pontas me impediam de ser uma pessoa mais tolerável. Ainda há muito a fazer aí, mas acho que já tracei as trilhas para que a erosão do tempo cumpra seu caminho.

Para os próximos dez anos, eu planejo bem poucas coisas, pois sei que o processo será mais complicado. Não tenho o viço e ímpeto dos teenagers ou o charme pós-jovem dos trintões. Serei, de fato e direito, uma pessoa de meia-idade (se a expectativa de vida bazuca aumentar para os cem anos) e, como tal, caio no limbo dos velhos demais para “baladas” e dos jovens demais para a meia-entrada e passagem gratuita de idosos. Serei, definitiva e irremediavelmente, um estranho no meu ambiente de internet. Minha filha– minha luz, minha obra, minha vida – deixará de ser uma menina e cairá no mundo, ávida e ansiosa por devorá-lo como todas as meninas-mulheres dos seus quase-vinte anos. E as mulheres… bem… essas serão capítulos para outros na minha história, já não tenho mais a paixão e a libido. Sou uma lata vazia de vaselina. Um pacote rasgado de camisinhas, um tubo de KY usado. Dos pecados capitais, a luxúria definitivamente não está mais no trono de predileta e a preguiça começa ensaiar uma lenta e paulatina tomada de poder.

Além disso a minha saúde não irá melhorar. Sempre fui sedentário e – não me venham com essa merda de “sempre há tempo para começar” – isso não ajuda a melhorar o meu péssimo condicionamento físico. O que eram irritações ou inconveniências, passarão a ser motivo de consultas, remédios e inquietude. Já são, fato, em menor escala. Tudo bem, né? está na hora de começar a fazer uso do plano de saúde que pago desde sempre.

Por outro lado, a minha capacidade de produzir não irá aumentar. De fato, já tive o meu auge vinte anos atrás e não aproveitei o que deveria. É um dos meus arrependimentos, mas faz parte de mim como a miopia e um dente torto. Só posso contar é com textos mais irrelevantes, mais autocomiserados e inócuos. Tudo bem, é o que preciso para manter um fogo ainda ardendo na mente. Talvez consiga aprende o que é determinação e disciplina e feche um livro, uma peça, um romance. E, no bojo, me forme na maldita e adiada faculdade.

A minha capacidade de degustar o novo é comprometida. Não consigo gostar realmente de nada que apareceu nos últimos dez anos. Não tenho a epifania da descoberta de uma banda, de um disco ou de um filme há eons. Tudo parece pastiche, plástico, isopor. Ainda assim tenho fé que há encantamento em alguma esquina e ainda há um livro que me encanta por vez ou outra. É a magia da literatura. Mesmo velho, Homero desperta um gigante que há em mim.

E a fortuna. Bom, essa eu já desapeguei. Se eu queria ser rico, muito rico, aos vinte e poucos, hoje espero só que as contas se paguem por si só. Que minha diversão eletrônica mantenha-se em dia, que eu coma, que eu beba, durma, tenha um teto e luz elétrica e acesso à internet.

O resto?

Bom… tenho dez anos de espera para ver o que o mundo me trará.